segunda-feira, 6 de maio de 2013

Mas a solidariedade é traço humano milenar. Existiu bem antes do socialismo e das religiões.

Paulo Guedes é economista e escreve quinzenalmente em ÉPOCA E-mail: pguedes@edglobo.com.br
O programa federal de transferência de renda Bolsa Família vai completar uma década de existência. São 13,8 milhões de famílias - 50 milhões de brasileiros pobres - recebendo em torno de 25 bilhões de reais em 2013. "As vantagens desse tipo de programa são claras. As transferências são direcionadas especificamente ao alívio da pobreza. E ajudam os indivíduos sob a forma mais útil: em dinheiro", registrava em "Capitalismo e liberdade" (1962) o liberal Milton Friedman.
A solidariedade tornou-se a principal bandeira dos socialistas. Mas as tecnologias mais eficazes para sua execução muito se beneficiariam da análise de simpatizantes liberais. O historiador Georges Lefebvre, socialista "jacobino", considerava "O Antigo Regime e a Revolução", do liberal Alexis de Tocqueville, "o mais belo livro sobre a Revolução Francesa". Em seu clássico "1789", Lefebvre descreve o surgimento do compromisso moderno com a "equidade" em quatro grandes ondas: a "revolução aristocrática", que desestabiliza o absolutismo real; a "revolução burguesa", que funda a nova ordem jurídica; a "revolução popular", que consolida o processo; e a "revolução camponesa", que o dissemina nacionalmente.
A popularidade dos social-democratas deveu-se exatamente a seu quase monopólio político da solidariedade. Secularizaram a bandeira das grandes religiões, conquistando corações ansiosos de massas desinformadas. Mas a solidariedade é traço humano milenar. Existiu bem antes do socialismo e das religiões. "Nossos ancestrais sustentaram indivíduos que não podiam contribuir ao grupo. A sobrevivência dos mais frágeis tem sido registrada por paleontólogos como marcos evolucionários de empatia e compaixão. Tais legados sugerem que a moralidade precede civilizações e religiões em pelo menos 100 mil anos. Mesmo nossa família dos quatro grandes primatas - chimpanzés, bonobos, gorilas e orangotangos - exibe demonstrações incontestáveis de solidariedade", registra o biólogo Frans de Waal, em "O bonobo e o ateu: em busca do humanismo entre os primatas" (2013).
Programas de transferência de renda em uma Grande Sociedade Aberta expressam nosso compromisso humanista com a solidariedade. O grande desafio é aumentar sua eficácia e reduzir o desperdício com a intermediação da classe política.

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